terça-feira, 28 de junho de 2011

Ele foi picado dez vezes por cobras venenosas, perdeu as mãos, a saúde e o emprego, mas não a coragem. E sua vida é só alegria...

E num desses dias de tristeza, ele decidiu buscar na fraqueza a superação dos males que o vitimaram.
Silvânia Pinheiro, da Agência ContilNet.
 
    
 
     Homem que perdeu as mãos e os pés consegue escrever e fazer vários serviços braçais e domésticos/Fotos: Wania Pinheiro
 

       Calçado com botinas já desgastadas pelo tempo, ele sobe o íngreme barranco apressado. Nos pés, o entusiasmo o leva a correr com ágil habilidade ao encontro dos que visitam sua humilde casa.

      Na mente, inúmeras histórias, talvez algumas das mais impactantes daqueles que conhecem os causos contados na região do baixo Macauã, rio afluente do Purus, na região do município de Sena Madureira, distante 144 quilômetros de Rio Branco.

       Gracindo Francisco Nascimento tem 61 anos, e desse total, momentos de muita dor, incertezas e uma intensa batalha pela vida.

      Aos 17 anos foi picado por uma cobra Jararaca quando trabalhava numa plantação de milho no seringal Estrela, localizado no mesmo rio.
                          Ele decidiu buscar na fraqueza a superação dos males que o vitimaram


Sua história seria apenas mais uma entre as milhares de vítimas de picadas de cobra na densa Floresta Amazônica.

Mas Gracindo continuou sendo uma vítima de sucessivos ataques de cobras, somando dez picadas de diferentes répteis ao longo de sua vida.

Caninana, Pico de Jaca, Buriti, Coral, Jaracuçu e Cascavel foram algumas das espécies que atacaram o agricultor, que a cada novo contato com o veneno contava sérios danos à sua saúde.

No isolamento dos seringais, sua única saída era recorrer as ervas naturais da floresta.
                                                Gracindo com a esposa e um dos netos

                                               Ele consegue pegar os alimentos com a colher
 
                          Sem as mãos, Gracindo não encontra problemas para manusear o remo
 

        Na primeira vez em que foi picado por uma jararaca, Gracindo perdeu o movimento das mãos e parte da visão. Para completar, contraiu hanseaníase em seguida, perdendo completamente os dedos das mãos e dos pés.

       Nos anos seguintes ele passou a ter fortes dores em vários membros do corpo, tendo que deixar o trabalho.

       E num desses dias de tristeza, ele decidiu buscar na fraqueza a superação dos males que o vitimaram.

        A partir daí, Gracindo, com o apoio da família, ampliou seu trabalho no campo, passando a colher arroz com os dentes, usar foice, machado, terçado, caçar, pescar e a fazer suas tarefas domésticas da mesma forma, mesmo que em ritmo diferenciado e limitado.


 
                                        "Também consigo beber água sozinho", diz Gracindo
 

        Nas fotos divulgadas nesta reportagem é possível acompanhar algumas das ações do cotidiano deste acreano nascido em 18 de outubro de 1950, pai de cinco filhos e casado com Antônia da Silva Bento, que faz questão de dizer que numa das infelizes ocasiões carregou o marido nos braços até a casa em que moravam à época.

       “Eu tive que trazer ele nos meus braços. Subi o barranco e conseguimos chegar. E, hoje, mesmo com as limitações que ele apresenta, nunca deixou de trabalhar para sustentar nossos filhos. E tem mais, ele não tem medo de cobra e nunca levou nenhum golpe de faca”, disse Antônia, que hoje é avó de quatro netos e dois bisnetos.


Aos 17 anos Gracindo foi picado por uma cobra Jararaca quando trabalhava numa plantação de milho
Ele também 'racha' lenha com o machado
                                 Só vendo para acreditar como ele trabalha com o machado
 
                                                               Viver para aprender


            Como se não bastasse à superação de diversas enfermidades que lhe assolaram ao longo da vida, Gracindo Francisco decidiu fazer algo novo há cinco anos. Foi a luta e se matriculou no Ensino Fundamental da Escola de 1º Grau localizada no seringal Oriente, há meia hora de barco da sua residência.

           Hoje, ele escreve o nome e conhece todo o alfabeto. “Já sei fazer o dela também”, diz entusiasmado apontando para sua esposa.

           Gracindo está cursando a 5ª série e nos momentos de folga ensina as crianças das redondezas a nadar nas turvas águas do rio Macauã, onde pretende viver até o fim de seus dias.  
                   Seus pés também foram prejudicados pela hanseníese e o veneno das cobras
                                    O cabelo "da moda", segundo Gracindo, atrai as mulheres
                                         Ele mandou desenhar a inicial de seu nome na cabeça
 
                                    Filhos e netos observam as histórias contadas pelo patriarca
Centenas de quilos de arroz foram colhidos por Gracindo, que utilizava apenas os dentes para fazer o serviço
 Sempre de bem com a vida, ele conta histórias a equipe da ContilNet
 
 
                   Até mesmo a foice, um equipamento difícil de manusear, é utilizada por Gracindo
Na primeira vez em que foi picado por uma jararaca, Gracindo perdeu o movimento das mãos e parte da visão.
 
 
 

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